“Nenhuma empresa inova porque é bonito, porque é legal; a empresa inova porque é um imperativo de mercado”, Paulo Mól, do IEL

jul 27 • Notícias • 2432 Views • Comentários desativados em “Nenhuma empresa inova porque é bonito, porque é legal; a empresa inova porque é um imperativo de mercado”, Paulo Mól, do IEL

Em entrevista à Divisão de Relações Internacionais do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), Paulo Mól, superintendente nacional do Instituto Euvaldo Lodi, comenta a pesquisa realizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) que discute a inovação no Brasil.

Realizada com o objetivo de mapear a percepção de executivos de empresas brasileiras e estrangeiras sobre o atual cenário de inovação dentro e fora das principais companhias em atividade no país, a pesquisa revela que, do total de entrevistados, 54% consideraram o nível de inovação no Brasil “baixo”, enquanto outros 8% avaliaram como “muito baixo”. Outros 35% afirmaram “nem alto, nem baixo”, enquanto apenas 3% opinaram como “alto” o potencial de inovação brasileiro.

Na entrevista, Paulo Mol, que é economista e também mestre em Economia, discute sobre cooperação internacional e a atuação empresarial brasileira no cenário internacional e em Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I).

Confira a entrevista (em versão escrita e estendida abaixo) ou assista em vídeo no Youtube, clicando aqui.

O que a pesquisa realizada pela CNI revela em relação à inovação no Brasil?

É uma pesquisa inédita e que foi realizada pela primeira vez com 100 empresários, sendo 60 de micro e pequenas empresas e 40 de grande porte. Foram escolhidas para a pesquisa empresas que estão em um ranking das mais inovadoras. Trata-se de um retrato que fizemos das empresas que têm a inovação de uma maneira sistemática e regular. A pesquisa chegou a algumas conclusões, que são importantes: a primeira delas é que 62% das empresas assinalaram que o grau de inovação no Brasil é baixo ou muito baixo. Então esse é um ponto importante porque os empresários afirmaram que uma das grandes razões para a inovação ser baixa é exatamente pelo fato que não há uma cultura de inovação no Brasil.

Esse é um ponto importante porque os empresários estão reclamando da sua própria atividade e trazendo para si mesmos a necessidade de serem protagonistas nessa agenda de inovação, como é em todos os países mais desenvolvidos no mundo. Isso é novo, porque é a tendência natural de você ter vários agentes que trabalham em inovação e transferir sempre as razões para os outros agentes. Nessa pesquisa os empresários mostram que eles também têm parte a fazer; da mesma forma como se precisa de um ambiente institucional mais bem formado e de universidades que estejam mais alinhadas com as demandas empresariais. A principal conclusão do trabalho é que a agenda de inovação é uma agenda para todos.

Como melhorar a inovação no país e de que forma o governo, as universidades, as empresas e o terceiro setor podem atuar para promovê-la?

O primeiro passo é ter uma coordenação das atividades, indiscutivelmente. A questão da inovação no Brasil é uma agenda muito complexa e ela depende de vários agentes. Não deve existir apenas a melhoria das condições institucionais que são propiciadas pelo governo, é apenas parte do processo. Também é preciso que haja um melhor desempenho dos empresários e das nossas universidades. Essa é uma agenda de país e para melhorarmos a nossa posição em inovação é preciso que haja uma iniciativa nacional em prol da agenda de inovação.

Em relação ao processo de internacionalização, como é que as empresas brasileiras podem trabalhar em parceria com empresas de fora do país?

A agenda de inovação é atrelada e associada a uma agenda de internacionalização. Muitas vezes, as pessoas não fazem essa associação de uma maneira tão direta – trabalho, inovação e comércio exterior. As pesquisas mostram que as empresas mais inovadoras são as exportadoras ou as que se internacionalizaram. Se nós queremos ter um melhor desempenho de inovação, devemos estimular nossas empresas a operarem no mercado internacional. E por que isso acontece? Quando a empresa brasileira opera no mercado internacional, de imediato ela vai estar à frente de novos consumidores – um consumidor muito mais exigente, novos modelos de gestão, novos fornecedores, novos materiais, enfim, tudo novo.

Então ela tem que se adaptar para trabalhar em um mercado que é muito mais exigente. E quando a empresa opera e faz essas inovações, ela tem ganhos de produtividade muito altos que traz para sua matriz aqui no Brasil. Esse processo de internacionalização e de desenvolvimento de parcerias, com laboratórios e firmas internacionais e universidades lá de fora é extremamente importante. A agenda de inovação é uma agenda que precisa de uma economia aberta, dinâmica e vinculada principalmente com os países mais desenvolvidos.

O senhor poderia falar sobre a ampliação das parcerias empresariais? Qual é a importância dessas parcerias acontecerem? E como fazer com que as parcerias historicamente baseadas em contatos pessoais tornem-se contatos institucionalizados?

A inovação hoje requer um nível de migração de recursos muito importante. Hoje, quando falamos de inovação, estamos falando de inovação aberta. É muito pouco provável que uma empresa consiga inovar apenas com projetos que sejam intramuros, dentro da própria empresa; ela precisa de recursos que estão fora das empresas. Recentemente, a CNI fez um trabalho com 22 empresas mostrando como essas empresas brasileiras inovam. E o que percebemos foi o seguinte: existem “n” formas de uma empresa inovar; não há uma regra de como inovar. Inovar pode acontecer de várias formas, mas tem um ponto que é absolutamente comum a todas: ninguém inova sozinho.

Quando uma empresa toma a decisão de inovar, ela vai, automaticamente, entrar em contato com vários outros agentes. Ela precisa se inter-relacionar com universidades, fornecedores e compradores de produtos, porque muitas vezes eles trazem muitas idéias para melhorar os seus produtos. Os caminhos são múltiplos, mas uma coisa é certa: ninguém vai inovar sozinho. A agenda de inovação necessita e muito de parcerias, e essas parcerias vão acontecer de várias formas. Essas parcerias podem acontecer desde processos de transferências tecnológicas até parcerias no intercâmbio de mão-de-obra.

É fundamental que tenhamos pesquisadores aqui no Brasil que tenham condições de ir para laboratórios lá fora para que possam conhecer as tecnologias internacionais. E o contrário, pesquisadores lá de fora virem até o Brasil para trabalhar aqui e juntos desenvolverem novas tecnologias, fazendo com que o conhecimento circule. Uma das perguntas da pesquisa foi exatamente essa: como essas empresas inovam? Uma parte importante dessas empresas mostra que essas inovações acontecem exatamente nesses intercâmbios que elas têm com universidades e centros de pesquisa, e que precisam aumentar mais e cada vez mais e aí é um ponto de melhoria especialmente para as universidades.

Isso porque 89% das empresas disseram o seguinte: os nossos recursos humanos quando saem das universidades não estão completamente preparados para trabalharem no mercado de trabalho. E por que não estão? Porque em grande parte precisamos muito mais do que habilidades técnicas, que é o que as universidades de hoje se predispõem a colocar. Hoje, muito possivelmente quando um engenheiro se forma e vai para o mercado de trabalho, a primeira ferramenta que ele vai trabalhar vai ser uma ferramenta de gestão, um Project. Em que momento ele foi trabalhado nesse sentido? Esse é um processo importante que precisa ser colocado na nossa agenda, e aí o que estamos falando é de um intercâmbio mesmo de informações, saber como é que o mundo lá fora está trabalhando na formação dos nossos engenheiros para que possamos ter um melhor desempenho aqui dentro.

O que é necessário para que a cooperação internacional em CT&I seja ampliada no Brasil?

Precisamos modernizar a cooperação internacional. A cooperação internacional tem que ser diferente do modelo que foi no século 20, quando era um modelo muito mais de transferência de tecnologia exclusiva entre empresas e universidades. Hoje, as empresas estão buscando muito mais parcerias com laboratórios privados ou empresas lá de fora. Não estou dizendo que os convênios com as universidades não são importantes, mas há outros agentes que entraram nesse modelo de inovação aberta que são igualmente importantes. Hoje, por exemplo, quando eu converso com as empresas, elas querem fazer com que os seus pesquisadores que estão nos seus quadros possam visitar outros laboratórios. Quando perguntamos aos empresários quais são os países que eles têm maior admiração pela agenda de inovação, seguramente estão Estados Unidos, Alemanha e Coréia. Desse modo, fazer com que os nossos estudantes e pesquisadores possam estar em contato não apenas com universidades, mas também com os laboratórios desses países, é um avanço muito importante.

Qual a importância do papel da informação e da comunicação para a inovação? Por que elas são importantes para o incremento da inovação?

Nenhuma empresa inova porque é bonito, porque é legal; a empresa inova porque é um imperativo de mercado. Ela inova porque precisa aumentar a produtividade, e ela precisa aumentar a produtividade para ganhar competitividade. Essa é a lógica. Inovação é um atributo de mercado em qualquer lugar do mundo, e o século 21 é conhecido como o século do conhecimento. Se você não tiver acesso às informações e ao conhecimento, você está fora do jogo. Esse é o jogo. Quanto mais você conseguir ter acesso a dados e informações e melhor classificar essas informações conseguindo utilizá-las a seu favor, tanto melhor. Uma empresa tem que estar conectada com o seu mercado consumidor para saber se o produto que ela está gerando atende às demandas desse mercado consumidor.

E por que muda? Porque a tendência natural do mundo é sempre ser dinâmico. Então, por exemplo, as questões ambientais começam a ganhar mais espaço. Desse modo, é importante saber quais são as principais rotas tecnológicas e o que é que o mundo está pensando, além de bons observatórios, com informações atualizadas e fazer com que os empresários tenham acesso a essa informações, bem como desenvolver cada vez mais o que chamamos de inteligência competitiva e saber o que está acontecendo lá fora e de que maneira o Brasil se posiciona aqui dentro. Essa é uma tarefa até muito importante para o governo.

O Brasil é um país que tem uma enorme gama de empresas multinacionais no seu território, mas geralmente esse trabalho é na área de operação, não tanto na área de pesquisa e desenvolvimento. Fazer com que essas empresas tragam seus centros de pesquisa e desenvolvimento é importante e, para isso, ter uma agenda de inteligência competitiva é fundamental. O governo tem que saber muito claramente quais são essas empresas, em qual tecnologia elas estão trabalhando, onde elas querem abrir seus centros de P&D e de que forma o Brasil pode atrair estes centros de P&D aqui pra dentro. Da mesma forma que o Brasil se candidata para trazer Copa do Mundo e Olimpíadas, e existe toda uma estratégia para atração, o Brasil deve ter uma agenda muito ativa de atração de centros de P&D, pois o país estaria trazendo conhecimento, melhores postos de trabalho e renda. E somente se consegue isso se houver uma estratégia de inteligência competitiva, sabendo de que maneira se consegue captar as oportunidades e trabalhando para trazer essas oportunidades para dentro do Brasil.

A pesquisa completa pode ser encontrada clicando aqui.

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